Maaza Mengiste “O Rei-Sombra”, 2019

O assobio de Bekafa: duas notas robustas, claras e sonoras – cantos de aves que costuram o vento. O Italiano inclina a cabeça. Roda devagar e levanta lentamente uma mão quando se ouve outra vez o assobio: as mesmas duas notas. O Italiano deixa cair a mão, e dá um grito de guerra agudo como um clarim. Kidane faz um gesto para Aklilu, e Aklilu faz sinal a Seifu, e Seifu assobia a Amha, e Amha faz um gesto e os seus homens começam a rastejar na direção do flanco esquerdo, e quando Kidane sobe a mão e a baixa logo a seguir num crescendo de cantos de aves, (…) enquanto no desfiladeiro o oficial Italiano rodopia, berrando ordens e pragas ao ver aqueles homens, mudos como fantasmas, emergirem da terra.

Primeiro: um zumbido nos ouvidos, depois a clareza penetrante do silêncio atónito. O rugido sonante de um vento colérico, depois o gorjeio melódico de um pássaro.

Mengiste, Maaza (2022) “O Rei-Sombra”, Tinta da China (p.150)

Leave a comment